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Brazil - Embaixada intercedeu pela extradição de mediador das Farc

Natalia Viana, 4 de janeiro de 2011

Dois telegramas publicados hoje pelo WikiLeaks mostra como os EUA intercederam em nome da Colômbia pela extradição do padre Francisco Antonio Cadena Collazos, conhecido como Padre Olivério Medina, colaborador das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia que vive no Brasil desde 1992.

Cadena estava no Brasil com status de refugiado, garantido em julho de 2006 pelo Conselho Nacional de Refugiados (CONARE). Em 2005, o governo colombiano pediu a sua extradição, acusando-o de ter liderado um ataque das Farc a uma base militar em 1991.

Os EUA intervieram em nome do país aliado, pedindo explicações a autoridades brasileiras sobre o status de refugiado garantido ao padre e dizendo-se “consternado”.

Para o ex-embaixador Clifford Sobel, o alto escalão do governo Lula teria interferido em favor do padre. Já os integrantes do CONARE viam interesse eleitoral do ex-presidente Álvaro Uribe no pedido de extradição.

Para o conselheiro político da embaixada colombiana, o assessor especial da presidência Marco Aurélio Garcia teria atuado em favor de Cadena.

Cadena foi durante muito tempo mediador das Farc no Brasil, sendo membro do secretariado internacional da organização. Em 2005, uma reportagem da revista Veja o acusou de ser o elo entre o Partido dos Trabalhadores e as Farc e de ter mediado doações de campanha para o PT em 2002. O partido nega.

Marco Aurélio Garcia

Em uma reuniao com o embaixador americano em 27 de julho de 2006, o conselheiro político da embaixada da Colômbia Juan Manuel Gonzalez Ayerbe, apontou Marco Aurélio Garcia como "ator-chave" na tomada de decisão sobre Cadena.

"Ele acrescentou que, durante os muitos anos que passou no Brasil antes da sua prisão no ano passado, (Cadena) cultivou laços com o PT do presidente Lula", relata um telegrama enviado a Washington no mesmo dia. Além disso, o colombiano mostrou preocupação com reuniões "com líderes do PT em uma casa nos arredores de Brasília (chamada Mansão do Coração Vermelho) pertencente a um membro do PT no Congresso", e insistiu que havia "amplas provas dos laços do Cadena com o PT.

O mesmo telegrama pede instruções para os próximos passos e desscreve que tanto americanos como colombianos estavam trabalhando para descobrir o porquê da decisão de garatir asilo a Cadena.

Explicações

Outro telegrama secreto da embaixada dos EUA em Brasília, enviado em 12 de setembro de 2006, relata que representantes da embaixada tiveram reuniões com o atual chanceler, Antônio Patriota, e a embaixadora Maria Luiza Veotti, então subsecretária do Itamaraty para organizações internacionais.

"O conselheiro político (da embaixada) enfatizou que o governo dos Estados Unidos não tinha intenção de interferir no processo legal brasileiro, mas notou a consternação do governo americano com a decisão, perguntando como o governo brasileiro podia conciliá-la com as suas obrigações sob a resolução 1371 do Conselho de Segurança da ONU" (que determina que os países devem lutar contra o terrorismo).

Para os representantes do governo, as razões para a garantia do status eram "humanitárias", já que o padre Medina “vivia pacificamente no Brasil” com a esposa e um filho.

A embaixada também procurou o secretário executivo do Ministério da Justiça, Luiz Paulo Barreto, que também presidia o CONARE.

Barreto, um colaborador de “longa data” em temas de contra terrorismo, explicou com detalhes as considerações do Conselho, que considerou o pedido do governo colombiano como enganoso, já que o crime havia sido cometido quinze anos antes e a acusação se baseava no depoimento de uma única testemunha.

“Barreto disse que o CONARE considerou o interesse do governo colombiano e o momento em que foi feito o pedido de extradição como sendo motivados por fatores políticos domésticos”, diz o telegrama.

Ele teria confirmado que o governo brasileiro sabia do papel de Cadena como negociador entre o governo colombiano e as Farc e questionou por que o então presidente Álvaro Uribe buscava sua extradição num ano eleitoral, enquanto outros governos “até apoiavam seu papel como facilitador do diálogo”.

O padre Medina recebeu o status de refugiado menos de dois meses depois da reeleição do ex-presidente colombiano Álvaro Uribe.

Segundo Barreto, o serviço de inteligência e as forças militares haviam “pesquisado extensivamente” durante diversos meses a história de Cadena com as Farc mas não haviam encontrado evidência de sua atuação como comandante guerrilheiro.

“Cadena diz ter sido um comissário político, professor e padre para as Farc na Colômbia, e depois um representante informal para o grupo do Brasil, mas não um combatente, e muito menos um comandante”, diz o documento.

“Mas no final, ele afirmou que Cadena defendeu uma tese convincente perante o CONARE, dizendo que ele tinha um medo bem fundamentado de ser morto pelos paramilitares se voltasse para a ele Colômbia, que superou as alegações e o pedido do governo colombiano, que pareceu questionável”.

Pressão do governo Lula

Em seguida o representante da embaixada perguntou a Barreto se o Conselho havia sofrido pressão política em relação ao caso, e ele respondeu que não. Também disse que o comitê estava aberto a apelações do governo colombiano e que Cadena teria seu status removido se continuasse a militância política.

Barreto teria então convidado o governo americano a entregar informações sobre Cadena, “assumindo pessoalmente a responsabilidade pela segurança e manejo apropriado dessas informações se elas envolverem métodos e fontes dos serviços de inteligência”.

O embaixador Clifford Sobel conclui o telegrama dizendo a explicação “não é particularmente crível”. Para ele, “a decisão do CONARE foi conduzida amplamente por forte pressão do alto escalão do governo brasileiro, e os representantes do governo no CONARE cederam a essa pressão”.

O embaixador aconselha que o governo americano ajude a Colômbia a montar um argumento “o mais forte e mais detalhado possível contra Cadena” : “Associar isso com quaisquer novas informações ou inteligência que os serviços do governo colombiano ou americano possam obter sobre a história de Cadena nas ações militares das Farc também seria útil”.